Parceria comercial e o correto enquadramento sindical

Um assunto que sempre é bastante debatido na Justiça do Trabalho diz respeito aos direitos previstos nas normas coletivas e a sua aplicação aos trabalhadores de determinada categoria. Neste sentido, a discussão reside justamente no que se refere ao enquadramento sindical dos empregados.

 

Isso porque é sabido que algumas categorias e/ou atividades possuem maiores benefícios normativos se comparadas com outras, e, por isso, muitas vezes a questão é judicializada perante o Poder Judiciário Trabalhista para aferir se houve ou não correto enquadramento sindical, e, por conseguinte, para que sejam assegurados determinados direitos à classe trabalhadora.

 

Dito isso, ficam os seguintes questionamentos: como se dá o correto enquadramento sindical em nosso país? Em caso de empresas que atuam em parceria comercial existe alguma diferença? Qual é o posicionamento da jurisprudência sobre o assunto?

 

À vista disso, considerando as inúmeras dúvidas e inquietações que afligem não só os trabalhadores como também os empregadores, a temática foi indicada por você, leitor(a), para o artigo da semana, na colunaPrática Trabalhista (https://www.conjur.com.br/secoes/colunas/pratica-trabalhista)Prática TrabalhistadestaConJur, razão pela qual agradecemos o contato.

 

Em relação aos critérios de representação sindical, oportunos são os ensinamentos de Carlos Henrique Bezerra Leite:

 

“Tendo em vista que a árvore sindical brasileira é bifurcada em dois ramos – um, integrado pelos trabalhadores e outro, pelos empregadores -, é possível encontrar alguns critérios que procuram explicar a base sociológica sobre a qual o sindicato se assenta. Tudo dependerá, como veremos adiante, do modelo sindical a ser adotado pelo respectivo Estado.

 

Assim, pode haver sindicato por profissão, que reúne todos os que militam numa determinada atividade profissional, independente da empresa ou do setor de atividade que trabalhem. Exemplo: todos os engenheiros que se reúnam num sindicato, os motoristas, os médicos, os advogados, etc. Um outro critério é o sindicato por empresa, que seria aquele representativo de todos os trabalhadores que laboram numa empresa, independente da profissão que nela exerçam. Estados Unidos, Itália contemporânea e Chile adotam esse modelo.

 

É possível ainda, a existência do sindicato por categoria profissional ou econômica, (….). O Brasil adota, como regra, o sindicalismo por categorias econômicas e profissionais, admitindo, excepcionalmente, o sindicato por profissão, também chamada de sindicato representativo de categoria profissional diferenciada (CLT, artigo 511, § 3º).”

 

Para que seja realizado o correto enquadramento sindical, nos termos dos artigos 511 e 581, § 1º e 2º, da CLT, se faz necessária observar a atividade preponderante do empregador, de sorte que, em cumprimento à norma celetista, verifica-se que o legislador criou uma regra específica para as empresas que exerçam atividades em várias partes e em diversos setores.

 

Uma recente questão que tem sido judicializada se refere ao correto enquadramento sindical dos trabalhadores que prestam serviços para as empresas tidas por lei como instituições de pagamento, ou seja, se tais trabalhadores poderiam ser enquadrados na condição de bancários e/ou financiários. O debate ocorre notadamente pelo fato de tais empresas não serem típicas instituições financeiras, e, portanto, não haveria que se falar em equiparar estes trabalhadores à condição de bancários e/ou financiários.

 

Por certo que muitas vezes estas instituições de pagamento operam em parcerias com outras empresas que integram grupos empresariais que trazem dentro do conglomerado uma efetiva instituição financeira. Acontece que a existência de parceria comercial não implica dizer que as atividades são idênticas, eis que a instituição de pagamento opera, por regra, apenas como uma intermediadora, equiparando-se ao correspondente bancário, possuindo, inclusive, previsão legal para sua atuação, nos termos da Lei 12.865/2013.

 

O Tribunal Superior do Trabalho possui duas teses vinculantes que versam sobre a questão do enquadramento sindical envolvendo a categoria dos financiários. Eis o Tema 177:“Os empregados das administradoras de cartão de crédito enquadram-se na categoria profissional dos financiários”.Já o Tema 179 do TST traz aduz o seguinte:“Os empregados de loja de departamento não se enquadram na categoria dos financiários”.

 

Comparando as duas diretrizes vinculantes, infere-se que prevaleceu o entendimento no âmbito da Corte Superior Trabalhista no sentido de que os empregados, a exemplo daqueles de lojas de departamento, que não lidam diretamente em seus afazeres com atividades de coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros, próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, são equiparados à figura dos meros correspondentes bancários, não sendo possível enquadrá-los na categoria de financiários.

 

Ora, ao firmar o Tema 179, o TST destacou que a comercialização de cartões de créditos, por exemplo, realizada por lojas de departamento, não configura atividade-fim de instituição financeira, de modo que essa prática visa impulsionar as vendas e reflete a modernização do comércio que, inclusive, não raras as situações, oferece inclusive o serviço de pagamento de contas, aproximando-se da função de correspondente bancário.

 

Partindo-se de tal pressuposto lógico, parece que idêntico tratamento jurídico deve ser concedido às instituições de pagamento, afinal, conquanto se possa ter eventual semelhança de suas atividades se comparadas àqueles privativas de instituições bancárias e/ou financeiras propriamente ditas, por certo que a natureza jurídica de cada uma delas é totalmente distinta, cujo marco regulatório é feito pormenorizadamente pelo Banco Central.

 

Se é verdade que nem toda empresa administradora de cartão pós-pago se enquadra como financeira, como se dá,v.g., com as instituições de pagamento, reguladas pela Lei 12.865/13, indubitavelmente que a parceria comercial, no exercício de atividades financeiras em lojas de departamento para vendas de produtos, se assemelha a de um correspondente bancário, razão pela qual também não enseja o enquadramento sindical de financiário.

 

Aliás, em recente decisão monocrática, de relatoria do ministro Sergio Pinto Martins (AIRR – 0000720-53.2023.5.17.0004), se concluiu que não há como enquadrar um empregado na categoria profissional de financiário na hipótese em que a empregadora se tratar de uma operadora de cartão de crédito, instituição de pagamento. Para tanto, de se citar os trechos da decisão singular proferida no âmbito da 8ª Turma do TST:

 

“Verifica-se que o enquadramento sindical do Reclamante deve ser determinado pela atividade preponderante do empregador, nos termos do art. 511, §§ 2º e 3º, da CLT, e que o Estatuto Social da Reclamada e a autorização do Banco Central evidenciam que se trata de uma instituição de pagamento, nos moldes do art. 6º, III, da Lei nº 12.865/2013, sem exercer atividades típicas de instituição financeira, vedadas por força do § 2º do mesmo dispositivo legal.

 

Ademais, a reclamada atua como emissora de moeda eletrônica e de instrumento de pagamento pós-pago, sendo autorizada pelo Banco Central e limitada à prestação de serviços de pagamento, sem configurar intermediação ou aplicação de recursos financeiros, conforme previsto na Lei nº 4.595/64.

 

Acrescente-se que a tese do STF firmada no julgamento do Tema 725 é no sentido de ser lícita a organização do trabalho da maneira que o empregador considere mais adequada ou conveniente. Nesse contexto, não cabe falar em formação de vínculo de emprego diretamente com o tomador dos serviços ou em equiparação salarial ou enquadramento do empregado na categoria dos financiários”.

 

Em arremate, para que ocorra o adequado enquadramento sindical, se faz necessária a prévia análise do objeto social da empresa, bem como a correta identificação da atividade preponderante econômica desempenhada e a legislação vigente. Além disso, é preciso também se atentar para aratio decidendidos atuais precedentes vinculantes que estão sendo firmados pela Corte Superior Trabalhista, evitando-se, com isso, a errônea má-aplicação ao caso concreto. Por fim, vale sempre lembrar que não tendo a empresa sido representada por seu sindicato e/ou participado da negociação coletiva juntamente com categoria profissional, impossível se conceder os benefícios normativos daí decorrentes a seus empregados à luz da Súmula 374 do TST.

 

Se você deseja que algum tema em especial seja objeto de análise pela ColunaPrática Trabalhistada ConJur, entre em contato diretamente com os colunistas e traga sua sugestão para a próxima semana.

 

Disponível em Curso de Direito do Direito do Trabalho. 14ª ed. – São Paulo: SaraivaJur. 2022. Página 878/879. Acesso em 11.08.2025.

 

CLT, Art. 511. É lícita a associação para fins de estudo, defesa e coordenação dos seus interesses econômicos ou profissionais de todos os que, como empregadores, empregados, agentes ou trabalhadores autônomos ou profissionais liberais exerçam, respectivamente, a mesma atividade ou profissão ou atividades ou profissões similares ou conexas.  § 1º A solidariedade de interesses econômicos dos que empreendem atividades idênticas, similares ou conexas, constitue o vínculo social básico que se denomina categoria econômica. § 2º A similitude de condições de vida oriunda da profissão ou trabalho em comum, em situação de emprego na mesma atividade econômica ou em atividades econômicas similares ou conexas, compõe a expressão social elementar compreendida como categoria profissional. § 3º Categoria profissional diferenciada é a que se forma dos empregados que exerçam profissões ou funções diferenciadas por força de estatuto profissional especial ou em consequência de condições de vida singulares. § 4º Os limites de identidade, similaridade ou conexidade fixam as dimensões dentro das quais a categoria econômica ou profissional é homogênea e a associação é natural.

 

CLT, Art. 581. Para os fins do item III do artigo anterior, as empresas atribuirão parte do respectivo capital às suas sucursais, filiais ou agências, desde que localizadas fora da base territorial da entidade sindical representativa da atividade econômica do estabelecimento principal, na proporção das correspondentes operações econômicas, fazendo a devida comunicação às Delegacias Regionais do Trabalho, conforme localidade da sede da empresa, sucursais, filiais ou agências. § 1º Quando a empresa realizar diversas atividades econômicas, sem que nenhuma delas seja preponderante, cada uma dessas atividades será incorporada à respectiva categoria econômica, sendo a contribuição sindical devida à entidade sindical representativa da mesma categoria, procedendo-se, em relação às correspondentes sucursais, agências ou filiais, na forma do presente artigo. § 2º Entende-se por atividade preponderante a que caracterizar a unidade de produto, operação ou objetivo final, para cuja obtenção todas as demais atividades convirjam, exclusivamente em regime de conexão funcional.

 

Disponívelaqui (https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12865.htm)aqui.

 

Disponívelaqui (https://www.tst.jus.br/documents/10157/33660380/Ac%C3%B3rd%C3%A3o_177.pdf/77743482-8bdc-ae22-ff07-9f06c64dd8f5?t=1752002841981)aqui.

 

Disponívelaqui (https://www.tst.jus.br/documents/10157/33660380/Ac%C3%B3rd%C3%A3o_179.pdf/b3ed0544-14cc-d6ec-d70f-99f8a96a80bc?t=1752002873546)aqui.

 

NORMA COLETIVA. CATEGORIA DIFERENCIADA. ABRANGÊNCIA.

 

Empregado integrante de categoria profissional diferenciada não tem o direito de haver de seu empregador vantagens previstas em instrumento coletivo no qual a empresa não foi representada por órgão de classe de sua categoria. (ex-OJ nº 55 da SBDI-1 – inserida em 25.11.1996)

 

Observação: (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 55 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

Fonte: Conjur


Voltar

Compartilhar

Todos os direitos reservados ao(s) autor(es) do artigo.

×